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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

História para 17.08.2012


HISTÓRIA BONITA DO BONECO FEIO


Era uma vez um boneco muito feio. Tinha nascido
numa folha de papel, de lápis distraído de um senhor, que
estava a pensar noutras coisas.
Quando o senhor acabou de pensar no que estava  a
pensar, amarrotou o papel e atirou-o para um canto. Era um
senhor muito desarrumado, sem nenhumas maneiras  e
talvez sem cesto dos papéis em casa...
Passado tempo, muito tempo, uma pá e uma vassoura
pegaram no papel amachucado e atiraram-no para dentro
dum caixote. Ainda mais feio e sujo ficou o boneco. Que
pouca sorte a dele!

Quem manejara a pá e a vassoura pôs o caixote à porta.
Veio então o vento, que andava a limpar tudo. O papel,
onde ia o boneco, voou, levado pelo rodopio. Voou, voou e
foi ter a uma casa. Estavam as janelas da casa abertas de
par em par, à espera sabe-se lá de quê. Foi fácil ao papel
entrar, sem pedir licença. Entrou, rebolou, bolinha leve
pelo soalho, e foi ter a um quarto.
Era uma casa desabitada, vazia de gente e de móveis.
Que préstimo teria ali aquele boneco feio? O quarto
escureceu. Fez-se noite no quarto e na rua. Num grande
silêncio, tudo (que era bem pouco...) se deixou levar por
um longo sono, de sonhos sem fim. Nem se deram aos seus
estalidos do costume as tábuas do soalho.
Foi no meio do silêncio que o boneco desta história
resolveu, ainda a medo, sair da folha de papel, que lhe
servira de leito. Pôs um pé fora, depois outro e saltou para
o chão. Uf!

Numa espreguiçadela, endireitou os bracinhos de linha
e, dando uns passos incertos, habituou as pernas a andar.
Que bem se sentia.
E foi andando, à maneira de quem vai visitar um museu
ou um palácio muito antigo. Ou à maneira de quem se
passeia por um castelo encantado...
De mãos atrás das costas, medindo os passos que dava,
mirando o que havia a mirar, o boneco feio atravessou
quartos, explorou salas, desceu escadas, subiu escadas  e
percorreu corredores. O silêncio à sua volta não lhe metia
medo. E de que havia ele de ter medo, se mal ou quase
nada conhecia do mundo?

Ia ele por um corredor, nos seus passinhos leves  e
tranquilos, quando viu aparecer à sua frente uma fieira de
bonequinhos pequeninos, talvez da mesma raça, também
malfeitões e de bracinhos de linha feitos a lápis. Vinham a
dançar, mãos nas mãos, e a dançar ficaram à sua frente.
Depois, a dança alterou-se e eles, continuando de mãos
dadas, fizeram uma grande roda à roda do bonequinho feio.
Nele não houve sinal de espanto nem de susto. Estava
preso no meio da roda e olhava para os bonecos que
rodopiavam à sua volta, como se estivesse a medir
parecenças. Sentia-se, afinal, entre amigos.
E tinha razão.
– Príncipe e senhor, há quanto tempo o esperávamos –
disseram os bonequinhos, em coro, interrompendo a dança
e fazendo uma vénia de todo o tamanho.

– Mas eu não sou nenhum príncipe – explicou-se  o
boneco feio. – Sou um boneco feio como vocês, desenhado
numa folha de papel por um senhor distraído.
– Schiu! – pediram os bonequinhos. – Nós sabemos, ou
melhor, calculamos. Também nós fomos feitos por um
menino, num caderno de desenho. O menino cresceu,
deixou esta casa e esqueceu-se de um monte de cadernos e
livros numa despensa. Como vês, somos parecidos.
– Então porque me chamam príncipe?
Os bonecos desenhados por um qualquer menino
aproximaram-se ainda mais do boneco feito por um senhor
distraído e, todos de cabeças juntas, como um enorme
cacho de oitos e de zeros misturados, segredaram-lhe o que
nós, também em segredo, passamos a contar.

Naquela casa abandonada, vivia uma grande tristeza.
Dava-se o caso que, entre os cadernos e livros esquecidos,
havia um, cheio de lindas gravuras coloridas, que contava
a história de uma princesa, a princesa Jasmínia, conhecem?
Tudo estaria bem se, por qualquer acaso ou má sorte, ao
livro não faltasse a última página, precisamente aquela em
que iria aparecer, mesmo a propósito, o príncipe que
salvaria a princesa Jasmínia do encanto da fada má.
Depois? Ora, depois, era a boda do casamento, a luzida
festa e muitos e muitos anos de felicidade.
Por palavras, o príncipe já entrara na história e salvara a
princesa. Sucedia, porém, que na última página é que
estava a gravura da princesa e do príncipe de braço dado,
atravessando alas de povo, que os aclamava. Ora a última
página, alguém a arrancara, talvez uma fada má, quem
sabe? E a história quase a acabar, a princesa quase a casar,

o velho rei quase a abraçar a filha querida, o povo quase a
aclamar os noivos reais, o cortejo quase a sair do palácio,
as trombetas quase a soarem, os tambores quase  a
rufarem... Mas nada disto sucedia, porque faltava um folha,
porque faltava um príncipe em carne e osso, isto é, um
desenho, para casar com a princesa. Estava, há que anos,
inconsolável a princesa Jasmínia, à beira da página que lhe
iria trazer o príncipe dos seus encantos.
– Porque é que um de vocês se não ofereceu para
príncipe? – perguntou o boneco feio.
– A nós já ela nos conhece, de há muito. Estivemos na
mesma prateleira, amarelecemos juntos... – explicaram os
bonequinhos. – Anda daí! Ela é linda, desenhada com

muita arte, pintada com lindas cores. Está debruçada da
varanda com uma rosa na mão e espera por ti. Vem
connosco, anda.
E foi assim que o boneco feio casou com a princesa
Jasmínia. Ai o têm, na margem da página, a sorrir para ela,
enquanto ela, da varanda, sorri para ele.


FIM










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