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domingo, 23 de setembro de 2012

História para 23.09.2012

O CASAL DE GAFANHOTOS

Era um casal de gafanhotos. Ele tinha repentes de
aventureiro. Ela não tanto.
– Vamos dar a volta ao mundo, mulher – dizia  o
gafanhoto.
– Demorará muito, homem? – perguntava a gafanhota.
– Vamos e vimos, num salto.
Mas não era bem assim. Tiveram de dar muitos saltos,
uns a seguir aos outros, sem que chegassem sequer a sítio
que se visse.
– Doem-me as dobradiças das pernas – queixava-se a
gafanhota.
Ele animava-a:
– É só mais uns saltos e estamos lá.
Lá, aonde? O gafanhoto não sabia, mas continuava  a
saltar como se tivesse molas nas pernas. E tinha.
A gafanhota foi ficando para trás, cada vez mais para
trás. Já nem se via, de tão longe que estava. E ele sempre
aos saltos para a frente.
Perderam-se um do outro.
– Quando tornar da volta ao mundo, encontro-a – dizia o
gafanhoto.
E continuou a sua sobressaltada viagem.
A gafanhota, derreadinha, pendurou-se numa haste de
caniço e esperou. Esperou que tempos. Ai que tempos, ai
que tempos, ai que tempos...
Estes ais todos são os suspiros da gafanhota, com
saudades do seu gafanhoto.
Até que viu, ao longe, do lado donde tinham partido, um
gafanhoto, saltaricando, em direcção a ela. Como  a
gafanhota sabia que o mundo é redondo, não estranhou. O
gafanhoto aproximava-se, a olhos vistos. Até que enfim.
Mas, afinal, não era quem ela esperava. Era outro
gafanhoto.
– O seu marido manda dizer que está para chegar não
tarda – avisou-a o saltarico, sem deixar de saltar.
Sempre era uma esperança. Ai, ai, ai, mais uma fiada de
suspiros da gafanhota, porque o tal, que prometia não
tardar, tardou.
– Se eu fosse para trás, encontrava-me com ele  e
encurtava-lhe a viagem – matutava a gafanhota.
Foi o que fez. Mas – azar dos azares! – desencontraram-
-se. Ele por uma linha de salto, ela por outra. Cruzaram-se
no ar, à distância de não se verem.
A gafanhota, depois do seu longo repouso, ganhara
novas energias e saltava, saltava, ao ritmo do seu coração
em ânsias.
– Hei-de encontrá-lo! Hei-de encontrá-lo! – era  a
música dela.
Quem lhe diria que se afastava, que se afastavam os dois,
cada um a saltar para a sua banda?
Quando o gafanhoto passou pelas pirâmides do Egipto,
disse:
– Já aqui estive uma vez.
Fez cálculos de cabeça e concluiu que estava a caminho
da segunda volta ao mundo. Por isso é que ele se sentia
cansado...
Parou.
Fincou as patas na cabeça da Esfinge, que, impene-
trável, olha o tempo, e esperou. Assim que lhe passasse a
quebreira das pernas, havia de continuar.
O gafanhoto sonolento cabeceava, quando uma voz
conhecida o despertou de vez.
– Ai o meu gafanhoto querido! Quem se quer bem
sempre se encontra...
Claro que era a gafanhota. Fizeram uma grande festa um
ao outro, na cabeça da Esfinge, e depois puseram-se  a
trocar impressões. Perguntava o gafanhoto para  a
gafanhota:
– Tu viste uma cidade onde as ruas são canais de água?
E aquela torre de ferro muito alta, no meio de uma cidade
linda, viste? E aquele grande rio, na Índia, onde vêm
banhar-se novos e velhos, doentes e sãos, viste?
Ela dizia que não. Não vira nada, no fito só de encontrá-
-lo a ele.
– Nem sabes o que perdeste, mulher. Mas deixa estar que
é a maneira de eu, agora, te mostrar isso tudo.
– Trouxeste postais? – perguntou a gafanhota,
ingenuamente.
– Quais postais, qual nada. Vamos correr mundo, dar
outra vez a volta toda – entusiasmou-se o gafanhoto.
– Fica para depois... – ainda propôs a gafanhota.
Sem sucesso. Já o gafanhoto saltava, de pernas elásticas,
como se a histótia agora tivesse começado.
– Anda, mulher. Não te atrases – gritava-lhe.
E lá foi ele a saltar, à frente.





FIM

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